A comissão interna de sindicância da Secretaria Estadual da Mulher, do Desenvolvimento Social, da Igualdade Racial, dos Direitos Humanos e do Trabalho (Cidadã), que apura o incêndio em que dez adolescentes morreram numa unidade socioeducativa de Goiânia, considera que o local tinha extintores no momento do fogo. Em seu relatório final, a sindicância ignora os depoimentos de 15 servidores que afirmam a falta do equipamento.
O incêndio começou depois que chamas em pedaços de colchão se alastraram por um alojamento no Centro de Internação Provisória (CIP), no Jardim Europa, no dia 25 de maio. Na última quinta-feira (9), 13 funcionários foram afastados para funções administrativas por suspeita de omissão de socorro.
Dos 20 servidores ouvidos em depoimento, apenas os três coordenadores da unidade afirmaram que o local contava com extintores. Além deles, a sindicância considerou, como prova, uma foto de seis equipamentos e ordens de serviço para a recarga de extintores do mês de julho de 2017. Esses dois documentos foram enviados por Luzia Dora, a diretora do Grupo Executivo de Apoio à Criança e Adolescente (Gecria), órgão dentro da secretaria responsável pelo sistema socioeducativo.
O coordenador geral do CIP, Eduardo Henrique Oliveira Silva, estava de férias no dia do incêndio. Ele afirma em seu depoimento que os extintores foram instalados em 2013, mas que por medida de segurança foram fixados longe do alcance dos internos, na sala de artesanato, na cozinha e no almoxarifado.
Na mesma declaração, Eduardo diz que, dois dias depois da tragédia, encontrou seis equipamentos no almoxarifado. Nenhum outro servidor ouvido apresenta essa versão, inclusive os que dizem que a unidade possuía os extintores.
Responsável pela unidade no momento da ocorrência, a coordenadora técnica Sany Silvano Nogueira defende que havia um equipamento na cozinha e diz acreditar que outros três ficariam na sala de revista. Ela alega não saber mais sobre o assunto porque isso seria de responsabilidade de Eduardo. No combate ao fogo, Sany utilizou baldes com água, enquanto outros dois servidores usaram uma mangueira acoplada em um hidrômetro.
Entre os 15 depoimentos que afirmam a inexistência de extintores, uma assistente social afirma que “nunca viu” o equipamento na unidade. Outra servidora diz que as caixas de incêndio eram usadas como armários de objetos comuns, como garrafas de água. Uma educadora declara que “há muito tempo não havia extintor nem nas caixas, nem em outro lugar”. Um agente afirma que eles deveriam estar na cozinha, mas não estavam.
Segurança
Os extintores de incêndio do CIP realmente deveriam ficar em área longe dos adolescentes internados e até poderiam permanecer em armários trancados, mas na condição de todos os funcionários terem uma chave, com segredo único. É o que prevê a norma técnica para estabelecimentos destinados à restrição de liberdade do Corpo de Bombeiros do Estado de Goiás.
Uma outra normativa da corporação prevê que prisões e reformatórios com mais de 10 pessoas por pavimento devem ter treinamento para 80% dos servidores. O CIP possuía na época do incêndio 80 internos e um pavimento. O coordenador geral da unidade diz que houve um curso de tática de incêndio com os funcionários.
Em depoimento para a sindicância, a maior parte dos servidores diz não ter feito o curso. Três confirmam que fizeram. Um pedagogo diz ter feito o treinamento de brigadista em 2017, a coordenadora técnica há cinco anos e uma educadora social, em 1986.
O Procedimento Operacional Padrão do Sistema Socioeducativo prevê, em casos de incêndio, “avaliar a melhor forma de conter o fogo e se há necessidade de uso de extintores, mangueiras ou chamar bombeiros”. Também é orientado que o servidor deve “agir com máxima rapidez no combate ao foco de incêndio.”
Por nota, a Secretaria Cidadã nega a informação da falta de extintor. A pasta reafirma a versão de que haviam seis extintores na unidade e que isso estaria comprovado através de fotos juntadas aos autos. Por telefone, a coordenadora Sany e a diretora do Gecria, Luzia Dora, disseram não querer comentar o assunto. A reportagem não conseguiu localizar o coordenador geral do CIP e a coordenadora pedagógica. Nenhum dos três coordenadores citados na matéria são considerados suspeitos de omissão pela sindicância.