Um projeto sobre licenciamento ambiental, aprovado em segunda votação pela Assembleia Legislativa do Estado de Goiás (Alego), prevê que caso a Secretaria de Meio Ambiente, Recursos Hídricos, Infraestrutura, Cidades e Assuntos Metropolitanos (Secima) não analise os pedidos de licença de empreendimentos no prazo máximo previsto, o órgão ambiental pode ser impedido de embargar a atividade ou aplicar penalidades no caso de qualquer infração ambiental. A Casa Civil afirma que irá sugerir o veto do artigo que abre brecha para crimes ambientais.

A matéria foi apresentada pelo deputado estadual Lissauer Vieira (PSB) no dia 10 de abril e aprovada no dia 2 de maio. O parlamentar admite que o artigo 5º abre brecha para que a Secima seja impedida de autuar empreendimentos que por ventura cometam um crime ambiental. Isso porque o texto diz que caso o órgão aplique alguma penalidade a um empreendedor que esteja com processo de licenciamento em aberto, com prazo de análise esgotado, o requisitante pode recorrer, e o recurso tem efeito suspensivo da penalidade. “Realmente pode abrir brecha, e isso foi discutido no governo. Vai ter um veto parcial do governo em relação a isso”, disse.

A Secima chegou a emitir um parecer desfavorável ao projeto. Procurador-chefe da Advocacia Setorial da pasta, Rodrigo Eugênio Matos Resende disse que o projeto tira a penalização da esfera administrativa ao impedir que o órgão ambiental embargue ou aplique penalidade caso tenha extrapolado o prazo de análise do pedido de licença. “Imagina, por exemplo, um grande poluidor que estiver causando um dano grave, e a Secima não pode lacrar o empreendimento. É uma coisa surreal”, criticou.

De acordo com o procurador, os primeiros quatro artigos não o preocupam, uma vez que se limitam a repetir questões que já estão em legislações federais. No caso dos prazos, eles estão já previstos em resolução do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), ligado ao Ministério do Meio Ambiente (MMA). O problema é justamente o artigo 5º, que condiciona a possibilidade de a Secima aplicar penalidade a estar cumprindo os prazos. “O artigo 5º é uma tragédia ao meio ambiente. E o projeto foi discutido sem maiores formalidades, sem ninguém se atentar a isso”, disse.

O procurador explica que a análise de licenças não é simples, e que às vezes a demora acontece por falta de robustez do próprio estudo ou projeto apresentado pela empresa. Para Resende, a matéria aprovada pelos deputados abre brecha para qualquer tipo de infração, possibilitando inclusive que empreendedores apresentem um projeto qualquer, aguardem o fim do prazo e façam o que quiser. “Às vezes o pedido não tem a menor sustentabilidade. O projeto dá alforria completa aos empreendedores”, disse.

Explicação

Lissauer afirma que o objetivo do projeto era prever que caso um empreendimento esteja aguardando o licenciamento ambiental, o prazo de análise esteja extrapolado e o empreendedor dê início à atividade, que ele não seja penalizado, uma vez que os documentos já estão para verificação do órgão ambiental. “Jamais nós queremos que tenham crimes ambientais. O fundamento é que se estabeleça prazos”, afirmou.

O procurador Rodrigo Eugênio afirma que na legislação federal não existe sanção para o caso de o órgão ambiental ultrapassar o prazo de análise dos processos, e que a lei cria uma sanção. No parecer enviado à Alego, o procurador afirma que a suspensão do embargo que consta no projeto aprovado “milita unicamente em prol do empreendedor”. “Se a empresa tiver causando dano, ela só responderá nas esferas penal e civil. A administrativa não. Isso gera um descompasso muito grande que diverge da Constituição”, pontuou.

10 mil processos esperam análise

A Secretaria de Meio Ambiente, Recursos Hídricos, Infraestrutura, Cidades e Assuntos Metropolitanos (Secima) possui mais de 10 mil processos de licença ambiental e autorização de uso de água aguardando análise, conforme o secretário Hwaskar Fagundes. Para melhorar o desenvolvimento da pasta, um plano de ação foi elaborado e será apresentado ao governador José Eliton (PSDB) ainda nesta semana. Conforme o secretário, serão várias ações, entre gestão de pessoas e procedimento correto de trabalho.

“São muitas modificações de médio e grande impacto, com pouco investimento”, afirmou. Para ajudar na pasta, que sofre com falta de servidores,Fagundes afirma que está retornando cinco servidores que estavam cedidos a outras secretarias ou estavam afastando fazendo cursos.

De acordo com ele, os primeiros meses à frente da Secima foram para entender o sistema. Posteriormente, o gestor diz que iniciou o trabalho de planejar e criar ações efetivas, que possam dar resultado.

Secretário critica iniciativa de deputado

Após apresentação do projeto do deputado estadual Lissauer Vieira (PSD), na Assembleia Legislativa do Estado de Goiás (Alego), o titular da Secima, Hwaskar Fagundes, enviou parecer contrário ao artigo 5º da matéria. Discute-se que o trecho específico abre brecha para que a Secima seja impedida de autuar ou embargar um empreendimento que por ventura cometa um crime ambiental, caso o pedido de licenciamento esteja ainda na pasta com prazo de análise extrapolado.

No documento com data do dia 20 de abril, o secretário diz ser contra o projeto, pontuando, por exemplo, que o mesmo atenta contra a lei estadual de 2013 que dispõe sobre as infrações administrativas ao meio ambiente.

Fagundes afirma que o projeto praticamente repete leis federais e a resolução do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), ligado ao Ministério do Meio Ambiente, que trata do assunto. O problema todo, segundo ele, está no artigo 5º. “Entendemos que a vedação do embargo é inconstitucional”, disse.

O secretário admite a existência dos atrasos nas análises dos processos, mas afirma que isso não pode significar que o Estado tenha que abrir mão de fiscalizar. “Não posso simplesmente aceitar que o interessado dê entrada em um processo de água, por exemplo, e que o atraso permita que ele se instale, sem eu ter condições de embargar”, afirmou. Para construção de barramentos, é preciso de licença ambiental, além de outorga (autorização) de uso de água.

Fagundes diz entender a importância da celeridade, e que trabalha para melhorar a questão. “Mas não posso concordar que dê entrada e aproveitando da minha deficiência não seja punido. Na condição de não embargar e a pessoa executar o projeto de forma deliberada, eu perco a oportunidade de evitar um impacto ambiental”, pontuou. Foi nisso que, segundo ele, o governo foi orientado a vetar o artigo 5º.

Produtores cobram rapidez em avaliações

A justificativa do projeto foi elaborada pela Associação dos Produtores do Vale do Araguaia (Aprova) e fala especificamente sobre a atividade de irrigação, que demanda autorização de uso de água e licenciamento ambiental. No documento, a associação cita que estatísticas levantadas pela imprensa indicam que cerca de 80% de todos pivôs em Goiás está aguardando a emissão das licenças. Matéria do POPULAR veiculada em janeiro deste ano diz que só 21,5% dos pivôs estão legalizados.

Conforme justificativa da Aprova, a maioria dos proprietários já tomaram medidas administrativas para obter as autorizações e estão apenas aguardando o órgão ambiental. No parecer da Advocacia Setorial da Secima, no entanto, pontua-se que só parte destes efetivamente iniciou a regularização junto à pasta, “seja através de pedido de outorga, seja através de pedido de licenciamento”.

Dentre os pontos citados na justificativa, a associação diz que fiscais têm cotidianamente ido a propriedades rurais com processo de licenciamento em aberto, a maioria tramitando há mais de um ano, e aplicado multas por falta de licença. A associação diz ainda que a falta das licenças dificulta a obtenção de financiamento da produção junto a instituições de crédito.

Reivindicação
Presidente da Aprova, Antônio Celso Barbosa Lopes afirma que a celeridade nos processos é uma demanda antiga do setor, que no ano passado já pedia a regulamentação das liberações das licenças. Para ele, o projeto fala de regulamentação ambiental, algo que já é previsto pelo Conama. “Queremos apenas que os prazos sejam cumpridos. O Estado não está cumprindo os prazos, e empurra o produtor para a ilegalidade”, disse.

Conforme Fagundes, os produtores não buscam impunidade em caso de crime ambiental. O principal ponto de questionamento da categoria é em relação às punições por falta de licença, mesmo quando o documento já foi protocolado e não foi analisado pela Secima no período máximo estipulado pelo Conama. “Para esses casos, você não pode ser punido. Em relação a outros crimes, a Secima pode punir”, pontuou. Para casos assim, de punição quando há processo e o prazo foi extrapolado pelo órgão ambiental, o produtor pode entrar com recurso.