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02/12/2015 - Insegurança nas trilhas de bike

A bancária Cibelle de Paula Silveira, de 31 anos, foi executada com um tiro às 21h30 de segunda-feira, quando fazia trilha de bicicleta com o marido Eduardo Oliveira Francisco e o amigo André Silva da Costa, na BR-060, na saída de Goiânia para Guapó. De acordo com os dois, Cibelle estava a uns 20 metros de distância quando foi abordada por dois homens.

Eles teriam tentado roubar a bicicleta dela, mas Cibelle não teria conseguido se soltar da proteção que há no pedal da bicicleta. Um dos ladrões atirou e fugiu com o comparsa que estava em uma moto sob a passarela da rodovia. O tiro atingiu o pescoço da bancária. Eduardo e André encontraram Cibelle agonizando.

Ela foi levada para o Centro de Atendimento Integral à Saúde (Cais) do Bairro Goyá, onde morreu. Essa é a primeira morte desde que ciclistas passaram a fazer registros de furtos e roubos de bicicletas nas delegacias, há cerca de três anos. De lá para cá, quase 200 registros de furtos e roubos já foram feitos.

Os criminosos agem mesmo durante passeios com grupos numerosos ou à luz do dia. Mas a falta de investigação dos crimes inibe os registros. Servidor público e coordenador do grupo Bicicletando, Emerson Martins acredita que muitos sequer comparecem à delegacia. Martins afirma que o pedido de segurança vem sendo feito e que, para o grupo, os crimes são praticados por grupos organizados.

Cibelle, o marido e o amigo estavam fazendo a trilha Goiânia-Abadia de Goiás (veja quadro) e foram abordados pelos assaltantes na volta. O caso foi registrado na Central de Flagrantes da Polícia Civil pelo delegado Rubens Rezende de Souza como “Morte a esclarecer”, mas já foi encaminhado à delegada Karla Fernandes, adjunta da Delegacia de Investigações de Homicídios (DIH), para apuração das circunstâncias em que ocorreu o crime.

Se for comprovado que se trata de um roubo seguido de morte (latrocínio), mesmo que em tentativa, o caso será transferido para a Delegacia Estadual de Investigações Criminais (Deic).

Vida

Evangélica, Cibelle era casada, não tinha filhos e trabalhava na Caixa Econômica Federal, na agência que fica no Palácio Pedro Ludovico Teixeira, na Praça Cívica. Ela e o marido estavam juntos há oito anos. Há cerca de um ano, decidiram andar de bicicleta por incentivo de amigos. Juntos, faziam trilhas em várias regiões de Goiânia e interior em ritmo intenso. Segundo colegas de pedal, ela era muito dedicada e gostava do esporte.

O velório reuniu dezenas de pessoas, entre parentes e amigos, todos muito emocionados. Muitos foram de bicicleta e usando a roupa específica para o esporte. Desde ontem, grupos de ciclistas estão fazendo homenagens a Cibelle em passeios pela cidade. As manifestações estão previstas para ocorrer até sábado em Goiânia.

Delegacias registraram 32 roubos; ciclistas acreditam em número maior

Este ano, as delegacias de Goiânia registraram 32 roubos de bicicletas, mas os ciclistas estimam que o número seja bem maior. “Há em média dois roubos por semana”, afirma Tony Magalhães, diretor da Liga Goiana de Ciclismo e presidente da Federação Goiana de Mountain Bike. Ações que não são diferentes dos assaltos a carros e residências, praticadas por ladrões organizados em quadrilhas que agem armados contra as vítimas.

Este tipo de roubo não era muito comum até três anos atrás, quando a bicicleta era vista como um meio de transporte de baixo custo. Com a popularização do ciclismo como esporte e dos passeios ciclísticos, as bikes passaram por uma verdadeira revolução tecnológica e os preços acompanharam a inovação. Se à primeira vista as bicicletas são todas iguais, nos detalhes elas são bem diferentes e os bandidos reconhecem as mais caras, relata Fernando Accioly, do grupo Pedal Goiano. Existem modelos que chegam a custar R$ 60 mil, preço de dois carros populares.

As bicicletas de mountain bike são as mais visadas, diz Accioly, e custam em média R$ 3 mil. Ele conta que certa vez os ladrões pararam um grupo que fazia trilha e escolheram as mais caras para levar em uma caminhonete. Segundo ele, os ladrões não roubam as que custam R$ 50 mil a R$60 mil porque não teriam facilidade para repassar. Mas não se intimidam com os modelos que custam R$ 15 mil a R$20 mil.

Na opinião de Tony Magalhães, além do alto preço, o que motiva o roubo de bicicleta é a própria vulnerabilidade do ciclista. “Ao assaltar um motorista de carro, o ladrão pode ser surpreendido por uma arma, já o ciclista não tem nada para se proteger”, compara. Além disso, a maioria dos circuitos é fora da cidade, em rodovias, estradas vicinais e serras. “Antigamente, nos locais onde andávamos de bicicleta não havia movimento, hoje eles deixaram de ser desertos.”

Grupos pedem solução de crimes e mais segurança

Ciclistas ouvidos pela reportagem concordam que fazer trilhas em grupos pequenos é arriscado e a recomendação é, sempre que possível, sair com um número grande de pessoas. Coordenador do grupo Bicicletando, Emerson Martins detalha que alguns grupos têm contratado segurança privada para acompanhamento durante os trajetos. Mas esta opção também esbarra em críticas. Ele defende que os grupos se reúnam para conversar e cobrar investigações e soluções para os crimes contra ciclistas.

O grupo GO Ciclo mantém uma página no Facebook onde, entre outras informações, compartilha imagens das bicicletas roubadas. Algumas foram recuperadas após a divulgação. Coordenador do grupo, Edson de Melo também recolhe assinaturas em abaixo-assinado que será levado às autoridades de segurança pública. No documento, os ciclistas pedem mais segurança não só em trilhas nas zonas rurais, mas também na área urbana.

Para onde vão as bikes roubadas

O destino das bicicletas roubadas ainda é uma incógnita para os ciclistas, afirma Fernando Accioly, do Pedal Goiano. Segundo ele, todas têm numeração no quadro, tal qual o chassi dos carros, e podem ser rastreadas. “Acredito que as bikes roubadas aqui sejam vendidas em Brasília, por meio de sites de vendas ou desmontadas para que suas peças sejam comercializadas para oficinas”, diz. Recentemente, a polícia prendeu uma quadrilha embarcando uma carga de peças de bicicletas, o que reforça essa hipótese.

Desde o ano passado que a Secretaria de Segurança Pública (SSP) vem conversando com grupos de ciclistas sobre o aumento dos roubos de bicicletas. Todavia, os próprios ciclistas têm consciência da dificuldade de garantir a segurança de todos os grupos que praticam o ciclismo ao mesmo tempo em diversas áreas. Na opinião de Aciolly, o que aumenta a segurança é andar sempre em grupos numerosos e evitar os locais considerados perigosos, como o trecho até o Autódromo de Goiânia. “Lá dentro é seguro, mas chegar lá é perigoso.”

Segundo a assessoria de imprensa da SSP, o chefe de gabinete do órgão, Edilson de Brito, recomendou à Delegacia de Investigações Criminais (Deic) a abertura de um inquérito para a identificação de possíveis grupos especializados nesse tipo de roubo. Além disso, a SSP e a Guarda Municipal têm disponibilizado apoio para eventos de maior porte e programados. Os ciclistas também têm contratado segurança privada, mas muitos estão abandonando as pistas devido à insegurança.

Violência ocorre até em passeios em grupo

O dentista Milton Collo, de 51 anos, é ciclista há cerca de 20. Ele relata que, na última semana, passeava com a esposa e um grupo de cerca de 100 pessoas. Eles pararam para descansar na Praça Dom Prudêncio Gomes de Oliveira, conhecida como Praça do Jacaré, no Setor Criméia Oeste, no momento em que ocorria uma feira. Antes de retomarem o passeio, duas pessoas foram abordadas por indivíduos armados, que levaram as bicicletas. “Não andamos sós e, mesmo assim, o bandido não perdoa.”

O funcionário público José Garotinho, de 56 anos, também teve o veículo levado por criminosos que o abordaram na rua. “Estava sozinho, indo encontrar o pessoal para um passeio. Chegaram dois homens em uma moto. Me abordaram, mostraram a arma e eu não reagi porque sei que não poderia fazer nada.”

O estudante e técnico em manutenção de postos Eucles Figueiredo Sobrinho, de 20 anos, deixou de andar de bicicleta. Ele mora em Senador Canedo e costumava praticar o esporte em trilhas da região na companhia de dois amigos. Dos três, apenas ele ainda tem a bicicleta. “A falta de segurança me impede de seguir com o esporte. Não ando mais de bicicleta.”

A administradora Aline Rodrigues, de 32 anos, pedala há um ano e meio e também sente medo em alguns trechos, mesmo em grupo. “Andamos em grupos grandes, de 40, 50 pessoas. Tomamos algumas precauções, mas esse crime está banalizado. O pior é que a maioria das bicicletas não custa caro. Pelo contrário. Mas o criminoso não quer saber.”

Fonte: O Popular